12 de março de 2010

Para Demóstenes Torres, os negros são culpados...

Ontem, durante audiência no Supremo Tribunal Federal para discutir o sistema de cotas em universidades públicas, o senador Demóstenes Torres (DEM-GO) usou da palavra para destilar todo o seu profundo conhecimento sobre a história do Brasil. Quem ouviu seu discurso saiu com a impressão de que os africanos eram os principais responsáveis pelo tráfico transatlântico de escravos. Que escravas negras não foram violentadas pelos patrões brancos, afinal de contas “isso se deu de forma muito mais consensual” e “levou o Brasil a ter hoje essa magnífica configuração social” de hoje. Que no dia seguinte à sua libertação, os escravos “eram cidadão como outro qualquer, com todos os direitos políticos e o mesmo grau de elegibilidade” – mesmo sem nenhuma política de inserção aplicada. Com isso, o nobre senador deu a entender que os negros foram os reais culpados pela escravidão no Brasil. As frases foram registradas pelos jornalistas Laura Capriglione e Lucas Ferraz, da Folha de S. Paulo.

A posição do senador é compreensível, se considerarmos que o discurso feito não foi um ataque à reserva de vagas para negros e afrodescendentes e sim uma defesa da elite política e econômica que controlou a escravidão no país e que, com algumas mudanças e adaptações, desembocou em setores do seu próprio partido.

Depois me perguntam por que a proposta que confisca terras de quem usou trabalho escravo está engavetada no Congresso Nacional…

Um comentário sobre o direito dos libertados exposto pelo senador: Em meados do século 19, com o fim do tráfico transatlântico de escravos, a propriedade legal sob seres humanos estava com os dias contados. Em questão de anos, centenas de milhares de pessoas estariam livres para ocupar terras virgens – que o país tinha de sobra – e produzir para si próprios em um sistema possivelmente de campesinato. Quem trabalharia para as fazendas? Como garantir mão-de-obra após a abolição?
Vislumbrando que, mantida a estrutura fundiária do país, o final da escravidão poderia representar um colapso dos grandes produtores rurais, o governo brasileiro criou meios para garantir que poucos mantivessem acesso aos meios de produção. A Lei de Terras foi aprovada poucas semanas após a extinção do tráfico de escravos, em 1850, e criou mecanismos para a regularização fundiária. As terras devolutas passaram para as mãos do Estado, que passaria a vendê-las e não doá-las como era feito até então.

O custo da terra começou a existir, mas não era significativo para os então fazendeiros, que dispunham de recursos para a ampliação de seus domínios. Porém, era o suficiente para deixar ex-escravos e pobres de fora do processo legal. Ou seja, mantinha a força de trabalho à disposição do serviço de quem tinha dinheiro e poder.

Com o trabalho cativo, a terra poderia estar à disposição para livre ocupação. Porém, com o trabalho livre, o acesso à terra precisava ser restringido. A existência de terras livres garante produtores independentes e dificulta a centralização do capital e da produção baseada na exploração do trabalho. Com o fim do tráfico e o livre mercado de trabalho despontando no horizonte, o governo brasileiro foi obrigado a tomar medidas para impedir o acesso à terra, mantendo a mão-de-obra reprimida e alijada de seus meios de produção.

O fim da escravidão não representou a melhoria na qualidade de vida de muitos trabalhadores, uma vez que o desenvolvimento de um número considerável de empreendimentos continuou a se alimentar de formas de exploração semelhantes ao período da escravidão como forma de possibilitar uma margem de lucro maior ao empreendimento ou mesmo lhe dar competitividade para a concorrência no mercado. Desde 1995, mais de 36 mil escravos contemporâneos foram libertados pelo governo de fazendas de gado, soja, cana…
Para além dos efeitos da Lei Áurea, que completa 122 anos em maio, trabalhadores rurais ainda vivem sob a ameaça do cativeiro. Mudaram-se os rótulos, ficaram as garrafas.
Mas, principalmente, o Brasil não foi capaz de garantir que os libertos fossem tratados com o respeito que seres humanos e cidadãos mereciam, no campo ou na cidade. Herança maldita presente na sociedade. E alimentada por discursos como o de Demóstenes Torres.
créditos:
http://blogdosakamoto.uol.com.br/2010/03/04/para-senador-os-negros-sao-os-culpados-pela-escravidao-no-brasil/
Leonardo Sakamoto é jornalista e doutor em Ciência Política.

9 comentários:

Jân Bispo disse...

Na verdade como dizem quando não se tem nada de bom para falar é preferivel que fique calado, ele deveria ter feito isso, aliás os discursos politicos contra as cotas anda comprovando como esse país ainda é preconceituoso e racista, se me perguntarem se sou ou não a favor de cotas diria que depende, sou a favor se for uma medida a curto prazo e que o governo vai tomar vergonha na cara e melhorar as escolas publicas na base ou seja no ensino fundamental e médio assim daqui a alguns anos, não sera necessária essa divisão que sim só aumenta e distancia as pessoas, porém hoje acho um absurdo as afirmações de que não é necessária a cota pois seria uma forma de apontar a raça negra como menos capaz, isso é desculpa de quem não quer assumir os problemas na área educacional do país, pois tudo o de pior que se podia fazer com os negros fizeram no pediodo colonial, nada apaga as humilhações da época e nada vai tirar essa vergonha da história nacional, no final das contas o que falta nesse país e menos falsidade e assumir de uma vez seus preconceitos e tentar resolve-los assim tudo fica mais fácil! parabéns pelo texto

Unknown disse...

Obrigado JB. Visitei seu blog gostei muito, ah o texto não é meu dei os créditos de quem escreveu, por isso o postei aqui porque realmente é muito bom e vale a pena repassar.!!contudo que o Dono seja lembrado!. abraçoss!!!

JOÃO PAULO RETTO disse...

Os políticos brasileiros poderiam nos dar o prazer do silêncio de vez em quando...

Tatiane disse...

Nossa, que comentário mais infeliz hein?
É esse tipo de pensamento que fz tanta merda com o Brasil! Esse povo não entende que a melhor maneira de fazer o país crescer é investindo na própria gente que faz esse país ser oq é.
Espero que esse discurso sirva só pra chocar e provocar a reflexão nas pessoas sobre o que elas esperam do futuro e não para arrebatar seguidores e consensores..
Eu espero que um dia esse povo q a gente elege , muitas vezes escolhendo os menos piores, infelizmente, possam cair em si e verificar o que deve ser feito em prol do bem comum.. Agora eu vou ali ver o vídeo pq particularmente me interssa muita...
Parabéns pelo blog e por ser mais uma que não contribui apenas pra cultura inútil e estar usando seu blog com função social, o que é muito legal!

Orlando Camargo disse...

A questão das cotas é delicada e merece uma discussão cuidadosa por parte da sociedade e dos governantes. Instituir cotas raciais é como um instrumento paliativo de desculpas por todos os desmandos sobre os negros que aconteceram, e acontecem até hoje, e uma forma de tentar evitar que os alunos recém-saídos das fracas escolas públicas parem seus estudos no ensino médio, por não terem condições mínimas de enfrentar o ensino superior. O problema é que esse tipo de "ajuda" acaba segregando mais ainda as raças e a própria comunidade universitária entre "cotistas" e "não cotistas". Enfim, muito complexo.

Parabéns pelo blog e valeu pelo comentário no meu. Mantenha-se passando por lá que em breve teremos mais posts!

Abraços!

joão victor borges disse...

ninguém merece esses membros do congresso e o que eles dizem. tem vezes que sintonizo de propósito nos canais políticos pra ver qual questão eles estão 'sabiamente' discutindo naquele momento, e sempre me surpreendo. essa da escravidão, apesar de ser muito polémica, só faz parte de tantas outras cogitações que esses deputados/membros do estado fazem.

http://anpulheta.blogspot.com

Tatiane disse...

Acabei de ver o vídeo agora...
Recomendo MUITOO !
Apesar dos comentários referentes a história dos negros no Brasil, horríveis por sinal, eu concordo com algumas coisas que o Demóstenes Torres disse, como por exemplo a não discriminalização do negro, referente á prioridade de vaga mna universidade. também acho que o problema seria resolvido se a prioridade fosse dada aos pobres (que incluiria negros, pardos, brancos, amarelos, outros), que são os que realmente precisam de políticas compensatórias. Mas eu acho que o comentário dele sobre as condições das escolas públicas foi preconceituoso e deu a entender que ninguém de uma escola pública está habilitado para ser um grande estudante universitário. Isso não condiz com a verdade.
Mas Você arrassou abordando o assunto e colocando esse vídeo à apreciação de todos que não estão interessados mais no tempo do video do que no seu proveitoso conteúdo.
Gostei do blog,
Quero saber oq vc tem a dizer.. tô te seguindo
;)

'«£. Hєηяιqυє← disse...

Políticos! Baah, as vezes deviam fkr kietos! ^^

Muito legal o teu bloog...!

Bjjks!

Unknown disse...

Como alguns já falaram a questão das cotas para negros é um caso que deve ser sempre analisado, a cota de escola pública também é problemática, pois é uma forma de facilitar a entrada de um estudante, e nunca melhorar a qualidade na educação. Eu optei pelas cotas quando prestei vestibular, mas não necessitei dela porque passei em 3° lugar no meu curso, mas não porcausa do ensino público que tive e sim pq paguei cursinho um ano, ou seja, de uma forma ou de outra saí ganhando, mas alguém de escola pública que não tinha possibilidade de pagar cursinho talvez não tenha passado pois o ponto de corte de escola pública foi maior que o Sistema Universal.
É díficil pra mim lembrar que no 2° ano eu não sabia nem o que era vestibular, e sei bem que existem muitas pessoas assim, sem perspectiva alguma de futuro. Ainda bem que certas oportunidades surgiram pra mim exatamente nos momentos finais no meu ensino médio e me guiaram no caminho sem volta graças a Deus, o caminho do aprendizado e a paixão pela leitura que é como um vírus. Naum é que eu odiava ler, mas eu nunca me imaginei indo em uma biblioteca de universidade e saindo de lá com 4, 5 livros por livre e espontânea vontade, mas infelizmente sei que muitos não terão essa mesma oportunidade.